sábado, 14 de novembro de 2009

Enviado por Ruy Fabiano - artigo
Lula e o golpe do Mensalão
Em entrevista à Rede TV!, gravada na quarta-feira, Lula voltou a fustigar Fernando Henrique Cardoso, com quem pretende polarizar os debates da sucessão do ano que vem.
Disse, ao comentar o artigo do ex-presidente, publicado há duas semanas – e que o acusa de promover um “subperonismo” no Brasil -, que ele, FHC, é “um poço de mágoas” e que tem “inveja” dele, Lula, por não ter obtido sua performance quando no governo. Nada que já não tenha sido dito antes à exaustão.
A novidade foi a reação do presidente diante de tema que lhe é profundamente incômodo: o Mensalão. Antes, limitava-se a dizer que não sabia de nada. Agora, simplesmente nega sua existência.
Diz que foi uma tentativa de golpe de Estado. Mas cai em contradição ao dizer ao repórter que, por ser presidente, não pode “ficar futucando” e só vai se inteirar “um pouco mais disso” quando deixar o cargo, a partir de janeiro de 2011.
Deixemos de lado o fato de que é dever de um presidente (e não de um ex-presidente) “futucar” tudo aquilo que diz respeito ao erário e ao interesse público.
Fiquemos na contradição: se não está inteiramente a par do que ocorreu (porque não pode ficar “futucando”), como pode afirmar que o Mensalão simplesmente não existiu?
Das duas, uma: ou não sabe o que aconteceu – e nesse caso tem que considerar a hipótese da existência concreta do Mensalão – ou sabe e, aí, sim, pode negá-lo. Mas não basta fazê-lo.
Precisa tomar providências contra o Ministério Público, que não apenas afirma a existência do Mensalão como o atribui a uma “organização criminosa”, que teria como comandante ninguém menos que o então mais próximo auxiliar do presidente, o chefe da Casa Civil, José Dirceu – demitido, aliás, exatamente em função das denúncias que o presidente hoje diz serem falsas.
O processo está no Supremo Tribunal Federal, que aceitou as evidências do que o presidente diz não ter existido e cujo propósito teria sido tão-somente derrubá-lo.
Nesse caso, é preciso responsabilizar como golpistas não apenas o Ministério Público, que fez a denúncia, como o STF, que a acolheu, além de entidades como a OAB, que chegou a examinar a hipótese de impeachment em 2006, e optou por transformá-la em notícia-crime à Procuradoria Geral da República.
Portanto, negar o Mensalão – pior: transformá-lo em manobra golpista – envolve mais que incontinência verbal: implica denunciar e punir os que engendraram a mentira.
Na mesma entrevista, outra novidade: Lula insinua responsabilidade na farra do Mensalão (afinal, existiu ou não?) ao PSDB, lembrando que Marcos Valério “não vem do PT, vem de outras campanhas”, numa alusão explícita ao Mensalão mineiro, que envolveu o senador tucano Eduardo Azeredo e que está sob julgamento no STF.
Ora, o crime atribuído a Azeredo não justifica nem atenua nenhum outro, anterior ou posterior.
Se o PSDB mineiro serviu-se Valério antes do PT nacional, o que importa não é a precedência, mas os delitos propriamente ditos.
O que une e equipara os dois episódios é a irregularidade no uso do dinheiro público. O que os distingue são as proporções. E o que chama a atenção é que, no espaço de uma única entrevista, o presidente afirma e nega a existência do Mensalão, conforme possa servir a seu raciocínio.
The Economist
Quase simultaneamente com o apagão, começou a circular a edição de The Economist, bíblia dos investidores, que coloca o Brasil nas alturas.
A revista, no entanto, em vez de falar de herança maldita do governo anterior, sublinha inversamente seu caráter benéfico.
Eis sua conclusão: “Lula está certo ao dizer que seu país merece respeito, como ele merece muito da adulação que tanto o agrada. Mas ele é também um presidente de sorte, colhendo o resultado do boom das commodities e governando numa plataforma de crescimento construída por seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso. Manter essa boa perfomance num mundo que enfrenta tempos difíceis significa que o sucessor de Lula terá de tentar resolver alguns problemas que ele fez questão de ignorar (...)”.
Nada a ver com o teor plebiscitário que se desenha para a campanha sucessória.

Ruy Fabiano é jornalista

Nenhum comentário: